domingo, 24 de junho de 2018

Avancemos para além de nós

por Deyvisson Costa


As aulas recomeçam no campus do Araguaia dia 25 de junho depois de mais de dois meses de greve estudantil pela manutenção do preço das refeições no Restaurante Universitário. Os alunos em Cuiabá ainda mantém o movimento paredista, diferentemente das unidades da UFMT em Sinop, Rondonópolis e Araguaia. 

Certamente, não é possível dizer com precisão o que se passou nesse período, mas algo aconteceu e  desconcertou a todos. Um acontecimento se deu e nos transformou.

No entanto, é preciso destacar que um acontecimento não pode ser avaliado pela quantidade de dias em que decorreu, pela quantidade de pessoas que mobilizou, pelas suas causas ou suas consequências. Na verdade, apenas a experiência – aquilo do qual saímos transformados – define um acontecimento.

O acontecimento, em stricto sensu, questiona o instante e sujeito na atualidade. Afinal, quais temporalidades outras emergiram com ocupações, encontros, assembleias, rodas de conversas, produções audiovisuais, fotografias, discursos eloquentes, marchas, gritos de ordem, intervenções artísticas, saraus e muito mais? Além disso, quais outras formas de subjetividade puderam se constituir para quem escolheu encavalar o próprio desejo no acontecimento?  Em outras palavras, em um tempo fora do tempo cronológico, quem tornou-se outro ao se lançar no abismo imprevisível do devir do acontecimento? O que deixamos de ser e estamos em via de nos tornar depois do que se passou?

Sejamos humildes e reconheçamos que nenhum indivíduo ou grupo de indivíduos pode ser considerado responsável por qualquer acontecimento. Ele acontece à revelia de toda planificação e agência direta, pois não pode ser capturado pela lógica da causa e do efeito. Dele, temos acesso apenas aos rastros inscritos em nossos corpos. Para compreendê-lo é preciso recorrer às novas configurações de nós mesmos decorrentes do próprio acontecimento.

Mas também sejamos francos, jamais saberemos exatamente o que somos. É preciso abandonar as narrativas míticas do eu que insistem em nos aprisionar em modelos identitários, pois “o homem que diz 'sou' não é, porque quem é mesmo é, 'não sou'”.  A centralidade do eu trata-se de uma ilusão que o acontecimento faz ruir: o eu é um outro, puro devir.

Avancemos para além de nós e para os próximos acontecimentos. Sejamos dignos de nossos acontecimentos!

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