segunda-feira, 21 de maio de 2018

História de uma fotografia: imagem e resistência


 
 Foto: Ronaldo Schemidt

O estudante Víctor Salazar de 28 anos corre desesperadamente em chamas durante os protestos na Venezuela, após a explosão de um tanque de gasolina. A fotografia, tirada por Ronaldo Schemidt e premiada como a Melhor Foto do Ano (2017) pelo prestigioso concurso World Press Photo (WPP), não revela o sofrimento pelo qual o jovem passou ao longo das 42 cirurgias seguintes, mas registra as lutas incessantes contra as diversas formas de fascismo.  



Na ocasião da fotografia, o jovem e muitos outros protestavam contra a Assembleia Constituinte, convocada por Nicolas Maduro. O governo venezuelano vem sendo duramente criticado tanto pela postura do presidente quanto pela situação que o país se encontra de crise financeira, escassez de alimentos, a falta de remédios, aumento da violência e a dura repressão pelas forças do Estado.



Esta insurgência, como outras inúmeras que ocorrem pelo mundo, impõem uma reversão do olhar, quando cada um precisa observar a si mesmo e suas práticas cotidianas indagando em que medida estaria colaborando com práticas fascistas, pois mesmo os mais puros e bem intencionados podem em algum momento se apaixonar pelo poder. Afinal, “como fazer para não se tornar fascista mesmo (e sobretudo) quando se acredita ser um militante revolucionário?”, questiona por Foucault no prefácio ao Anti-Édipo.



O poder está presente nos mais finos mecanismos do intercâmbio social: não somente no Estado, nas classes, nos grupos, mas ainda nas modas, nas opiniões correntes, nos espetáculos, nas relações familiares e privadas, e até mesmo nos impulsos liberadores que tentam contesta-lo (...) expulso, extenuado aqui, ele reaparece ali: nunca perece; façam uma revolução para destruí-lo, ele vai imediatamente reviver, re-germinar no novo estado de coisas - Roland Barthes




PONTO DE VISTA

Por Marcelo Duarte – historiador e acadêmico jornalismo e integrante do Grupo Limiar

Narrar a História é sempre árduo trabalho, pois há lugares e sujeitos que escapam à narrativa. Neste sentido, quando um historiador narra os acontecimentos, ele o faz de um lugar na história do qual não pode se separar.  Portanto, descrever a imagem premiada é uma oportunidade para compreender a nós mesmos e o nosso tempo.

Refletir sobre o significado da fotografia do jovem venezuelano em chamas, implica considerá-la como algo maior que apenas a truculência das forças policiais. Advogo que essa fotografia é a representação de um movimento de resistência mais amplo ao poder do Estado. Por mais que o poder tome a vida de assalto, haverá sempre uma força resistência que insiste em escapar. Logo, a fotografia possibilita olhar para algo além da biopolitica. É a potência da vitalidade social que faz frente às condutas de vida imposta pelo Estado e que transborda na imagem. Ou seja, ela representa aquilo que sempre escapará aos poderes estabelecidos:  a potência de vida daqueles que não se sujeitam às tramas do poder.

Mais que apenas uma fotografia de um rapaz em chamas premiada em concursos de relevância  trata-se do reflexo de uma vida não fascista





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